PREÂMBULO

Deus quis fazer de Sintra um verdadeiro paraíso enquanto o homem parece empenhado em transformá-lo num inferno. À magia, ao misticismo, ao mistério, ao romantismo e à história gloriosa de Sintra contrapõe-se actualmente a incompetência, o desinteresse, o desleixo, o desrespeito, a ganância e o oportunismo de quem tem por missão defender esta terra única e maravilhosa que Lorde Byron um dia designou como um Éden Glorioso. Celebrada por grandes vultos da cultura mundial do passado, Sintra não pode ser agora desrespeitada pelos medíocres. O futuro de Sintra só pode ser projectado com um total e rigoroso respeito pelo seu passado e pelas sua características únicas. Sintra não é uma terra qualquer e por isso mesmo não pode ser governado por uma gente qualquer. Só os sintrenses por nascimento ou por adopção, podem defender convenientemente este pedaço de paraíso que Deus nos concedeu. Para servir Sintra é preciso amá-la, senti-la, e quem melhor que os sintrenses para o fazer?

A ruína alastra um pouco por toda a parte, as fontes calaram-se e já não nos embalam com o seu canto refrescante. É imperioso reverter esta situação. Eu sei que há sintrenses bem mais competentes do que eu para lutar por Sintra. Há muito que venho lutando dentro das fracas possibilidades de que disponho, mas nem a modéstia dos meus argumentos nem o brilhantismo dos argumentos de quem sabe e pode mais do que eu, têm merecido a atenção dos responsáveis autárquicos competentes. Só nos resta continuar fazer ouvir a nossa voz, os nossos protestos e a s nossas sugestões. Todos não somos demais para defender a nossa SINTRA.

sexta-feira, 2 de maio de 2014

A LADROAGEM


O Verão chegou finalmente para nos brindar com muito sol e calor quanto baste que justifiquem umas agradáveis visitas às magníficas praias que o litoral sintrense nos oferece. Em Sintra, de há uns anos a esta parte, habituámo-nos a que, com a chegada da época estival, o velhinho carro eléctrico, um dos ex-libris da nossa terra, volte a circular diariamente para percorrer o lindíssimo percurso que liga Sintra à Praia das Maçãs em 45 minutos de puro deslumbramento.   

Há poucos anos, após várias décadas de ausência e depois de os  sintrenses se terem convencido de que não o voltariam a ver a a funcionar, eis que o eléctrico de Sintra voltou aos carris, primeiro apenas entre o Banzão e a Praia das Maçãs para alguns anos mais tarde voltar a Sintra para alegria de todos aqueles os que olham e sentem Sintra com o coração. Infelizmente não foi possível recuperar o percurso antigo, com partida e chegada junto à estação dos caminhos de ferro e muito menos a ligação à Vila Velha e às Azenhas do Mar como acontecia em tempos já longínquos mas só o facto de o eléctrico ter regressado a Sintra foi o suficiente para nos encher a todos de júbilo. Os sintrenses têm com o seu eléctrico uma fortíssima relação afectiva que nem um interregno tão longo conseguiu apagar.

Existe efectivamente um carinho muito especial das gentes de Sintra pelo seu carro eléctrico, carinho esse que nem a prolongada ausência conseguiu apagar. Não surpreendeu ninguém que o seu regresso fosse acolhido com tanto entusiasmo e expectativa. Aquelas carruagens centenárias e barulhentas  fazem-nos reviver, a nós sintrenses da velha guarda, uma infância e uma juventude há muito deixadas para trás, perdidas que estavam na poalha do tempo. Essas carrugens velhinhas ao voltarem a animar e a colorir os caminhos da praia fizeram  ressuscitar recordações ideléveis e levaram-nos a recuar no tempo aos tempos da meninice. Como é agradável a ouvir a “chiadeira” do rodado das carruagens nos carris, um ruido que, longe de ser desagradável, soa aos nossos ouvidos como de uma melodiosa sinfonia se tratasse. Sintra recuperou depois de muitos anos, um dos seus sons tradicionais.   

O eléctrico voltou a circular, os sintrenses rejubilaram, mas simultaneamente recearam que esse regresso viesse no futuro a ser uma vez mais  interrompido. Habituados a ver Sintra e o seu património votados ao desleixo e ao abandono e aa alastramento da detrioração e da ruína um pouco por todo o lado, os sintrenses temeram que esse mesmo desleixo voltasse a matar o nosso eléctrico. Tinham razão os sintrenses nos seus receios porque não tardou muito até que, devido a avarias várias que punham em causa a segurança dos passageiros,  a circulação ficasse reduzida ao trajecto entre Sintra e a Ribeira. O empenhamento da Câmara, e a colaboração de uma entidade privada permitiram entretanto que toda a via fosse recuperada e o eléctrico voltasse a circular normalmente. Desta vez tudo indicava que o regresso fosse definitivo. Puro engano..

O Verão está aí uma vez mais, as praias enchem-se de banhistas mas os carris, este ano, continuam desoladoramente vazios. Os sintrenses estranharam e perguntavam-se sobre a razão dessa ausência. A resposta chegou agora através do Jornal da Região. Ficámos a saber que o eléctrico não está a circular actualmente porque, imaginem, alguém roubou cerca de 400 metros de cabo de cobre da catenária entre a Ribeira de Sintra e a Ponte Redonda. Nada que nos surpreenda dado que há poucos anos ainda, até um chafariz  foi roubado no centro da nossa vila.    

Segundo o Jornal da Região apurou junto do Dr. Marco Almeida, vice-presidente da Câmara Municipal, prevê-se que o eléctrico volte a circular no final deste mês de Julho. Esperamos que, quando esta edição do nosso jornal chegar às mãos dos nossos leitores jáo  possamos ver de novo apinhado de passageiros a percorrer pachorrentamente o percurso que conduz até à praia.  

Mas…tem que haver sempre um mas neste país, há no entanto uma situação a ensombrar essa esperança. Segundo ainda o Jornal da Região foi lançado pela Câmara, um concurso para a execução de trabalhos de recuperação e conservação da via, obras indispensáveis para que a circulação dos eléctricos se processe  com toda a segurança, mas, (cá está o inevitável mas), como neste país nada é fácil, uma das empresas concorrentes impugnou o resultado desse concurso. Sabendo nós como, em Portugal, estes assuntos se arrastam no tempo há razões para recear que o tão desejado regresso do eléctrico já não aconteça este Verão. E se calhar nem para o próximo. Estou a recordar-me da famosa impugnação das obras da pensão Bristol, que demorou anos a resolver. Espero não termos aqui uma segunda edição desse lamentável exemplo.

Depois de substituido o cobre roubado fica o receio que a gatunagem volte a atacar. Há que estar atentos e tomar as medidas necessárias para acautelar novos furtos, o que diga-se não será tarefa fácil, dado que a ladroagem é uma espécie infestante que está a alastrar  rapidamente. Enquanto não se tomarem medidas para punir exemplarmente a criminalidade ela continuará a aumentar e temo que para além de voltarem a roubar o cobre acabem por roubar também o próprio eléctrico. Com guarda-freio e tudo. Já faltou mais.


Guilherme Duarte

(Artigo publica num dos números do jornal Cruz Alta em 2013) 

Sem comentários:

Enviar um comentário