O Verão chegou finalmente para nos brindar com muito sol e calor quanto baste que
justifiquem umas agradáveis visitas às magníficas praias que o litoral
sintrense nos oferece. Em Sintra, de há uns anos a esta parte, habituámo-nos a
que, com a chegada da época estival, o velhinho carro eléctrico, um dos
ex-libris da nossa terra, volte a circular diariamente para percorrer o
lindíssimo percurso que liga Sintra à Praia das Maçãs em 45 minutos de puro
deslumbramento.
Há poucos anos, após várias décadas de ausência e depois de os sintrenses se terem convencido de que não o
voltariam a ver a a funcionar, eis que o eléctrico de Sintra voltou aos carris,
primeiro apenas entre o Banzão e a Praia das Maçãs para alguns anos mais tarde
voltar a Sintra para alegria de todos aqueles os que olham e sentem Sintra com
o coração. Infelizmente não foi possível recuperar o percurso antigo, com
partida e chegada junto à estação dos caminhos de ferro e muito menos a ligação
à Vila Velha e às Azenhas do Mar como acontecia em tempos já longínquos mas só
o facto de o eléctrico ter regressado a Sintra foi o suficiente para nos encher
a todos de júbilo. Os sintrenses têm com o seu eléctrico uma fortíssima relação
afectiva que nem um interregno tão longo conseguiu apagar.
Existe efectivamente um carinho muito especial das gentes de Sintra pelo
seu carro eléctrico, carinho esse que nem a prolongada ausência conseguiu
apagar. Não surpreendeu ninguém que o seu regresso fosse acolhido com tanto entusiasmo
e expectativa. Aquelas carruagens centenárias e barulhentas fazem-nos reviver, a nós sintrenses da velha
guarda, uma infância e uma juventude há muito deixadas para trás, perdidas que
estavam na poalha do tempo. Essas carrugens velhinhas ao voltarem a animar e a
colorir os caminhos da praia fizeram
ressuscitar recordações ideléveis e levaram-nos a recuar no tempo aos
tempos da meninice. Como é agradável a ouvir a “chiadeira” do rodado das
carruagens nos carris, um ruido que, longe de ser desagradável, soa aos nossos
ouvidos como de uma melodiosa sinfonia se tratasse. Sintra recuperou depois de
muitos anos, um dos seus sons tradicionais.
O eléctrico voltou a circular, os sintrenses rejubilaram, mas simultaneamente
recearam que esse regresso viesse no futuro a ser uma vez mais interrompido. Habituados a ver Sintra e o seu
património votados ao desleixo e ao abandono e aa alastramento da detrioração e
da ruína um pouco por todo o lado, os sintrenses temeram que esse mesmo
desleixo voltasse a matar o nosso eléctrico. Tinham razão os sintrenses nos
seus receios porque não tardou muito até que, devido a avarias várias que
punham em causa a segurança dos passageiros, a circulação ficasse reduzida ao trajecto
entre Sintra e a Ribeira. O empenhamento da Câmara, e a colaboração de uma
entidade privada permitiram entretanto que toda a via fosse recuperada e o
eléctrico voltasse a circular normalmente. Desta vez tudo indicava que o
regresso fosse definitivo. Puro engano..
O Verão está aí uma vez mais, as praias enchem-se de banhistas mas os
carris, este ano, continuam desoladoramente vazios. Os sintrenses estranharam e
perguntavam-se sobre a razão dessa ausência. A resposta chegou agora através do
Jornal da Região. Ficámos a saber que o eléctrico não está a circular actualmente
porque, imaginem, alguém roubou cerca de 400 metros de cabo de cobre da catenária
entre a Ribeira de Sintra e a Ponte Redonda. Nada que nos surpreenda dado que há
poucos anos ainda, até um chafariz foi
roubado no centro da nossa vila.
Segundo o Jornal da Região apurou junto do Dr. Marco Almeida, vice-presidente
da Câmara Municipal, prevê-se que o eléctrico volte a circular no final deste
mês de Julho. Esperamos que, quando esta edição do nosso jornal chegar às mãos
dos nossos leitores jáo possamos ver de
novo apinhado de passageiros a percorrer pachorrentamente o percurso que conduz
até à praia.
Mas…tem que haver sempre um mas neste país, há no entanto uma situação a
ensombrar essa esperança. Segundo ainda o Jornal da Região foi lançado pela
Câmara, um concurso para a execução de trabalhos de recuperação e conservação
da via, obras indispensáveis para que a circulação dos eléctricos se processe com toda a segurança, mas, (cá está o
inevitável mas), como neste país nada é fácil, uma das empresas concorrentes
impugnou o resultado desse concurso. Sabendo nós como, em Portugal, estes
assuntos se arrastam no tempo há razões para recear que o tão desejado regresso
do eléctrico já não aconteça este Verão. E se calhar nem para o próximo. Estou
a recordar-me da famosa impugnação das obras da pensão Bristol, que demorou
anos a resolver. Espero não termos aqui uma segunda edição desse lamentável exemplo.
Depois de substituido o cobre roubado fica o receio que a gatunagem volte a
atacar. Há que estar atentos e tomar as medidas necessárias para acautelar
novos furtos, o que diga-se não será tarefa fácil, dado que a ladroagem é uma
espécie infestante que está a alastrar
rapidamente. Enquanto não se tomarem medidas para punir exemplarmente a
criminalidade ela continuará a aumentar e temo que para além de voltarem a
roubar o cobre acabem por roubar também o próprio eléctrico. Com guarda-freio e
tudo. Já faltou mais.
Guilherme Duarte
(Artigo publica num dos números do jornal Cruz Alta em 2013)
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